Canudos à Contraluz Na Cultura Literária

MARCO ZERO

MARCO ZERO
por José Plínio de Oliveira*


 Compadre José Vicente,
Vem o tempo e nos envolve
Cose as certezas da lida.
E se a vida nos convoca
Nas plagas do costumeiro
Então temos uma saída:
Labutar pelo Vaqueiro

Penso então nossas culturas
Suas agruras e lágrimas
Áridas como esta terra
Cerrada de nostalgia.
Agia o Vaqueiro outrora
Nas dobras destas caatingas
In riba do campião, alazão de boa fibra.

Êh! Vaqueiros de Canudos!!!
Vale do Vaza-Barris.
Vozes de ecoadas longas,
Varridasà luz do canto
Voando dentro dos cortes
Vertentes da Cana Brava,
Verdes como a luz da alva!

Vai Vaqueiro de Canudos,
Conduzir o teu rebanho
Remar o gado arredio
No rumo da sinfonia
Dos aboios exauridos.
Do interior da alma
Na calma da tua sina
Sentada em cima da sela.

Chame Jaciel Correia!
Tire a peia do jumento!
Vá buscar o mantimento
Que eu deixei no Bendegó...
Amanhã vai ter a ferra
Lá estaremos na certa
Com João do Cocorobó.


Traz o balaio de palma,
Pega nos chifre da rês
Rema mais pro lado esquerdo
Espera o gado sair.
Zé Vicente tá chegando
Já trazendo a encomenda,
Q’eu não queria pedir.

Vou buscar meu gibão novo,
Na tenda de Mané Velho,
Domingo vou para a Missa,
Depois passo no Peji.
Eu passei na Lei de Crente,
Por dentro dos Evangelhos,
Mas não pude prosseguir.

Quando Zé Dílson chegar,
Mand’elir na caiçara.
Q’eu vou cuidar da bezerra
Que pegou uma caroara
No cabeçote da sela
Tem um dedo de dinheiro
Mande buscar querosene
Pra botar no candeeiro.

Vou na festa dos Vaqueiros
Assuntar no meu ofício
Não tenho vício nem quenga
Eu sou guiado pro Cristo
Eu nasci para servir
Não faço caso por isto.

Mas tendo samba-de-roda,
Toré, Pífano e Poesia
Sou o primeiro a chegar
Eu não tenho fidalguia.
Guiado por som de samba
Danço até numa enxovia.

Fui no Sábado dos Caboco
Tinha um bando de mulé
Sambei no Pé-do-Cruzeiro
Até cair no banzé
Tomei cachaça na cuia,
Canjica doce e café.
Não sou cabra de arrelia,
Sou homem de muita Fé.

Botei meu chapéu de couro
Numa estaca de candeia
Pra servir de marco zero
No zelo desta cultura
Na minha lida por ela
Eu luto até na cadeia.
Compadre Jota Vicente,
Cabra decente no trato
Eu cato uma nesga de sonho
Na solidão dos caminhos
Eu não troco meu aió
Por um embornal de couro.
Eu conheço meu tesouro
Eu domino meus carinhos.

Por isso eu vou-me embora,
Eu moro em Massacará
Vou deitar as minhas mágoas
Numa rede de caroá
Dê-me a benção sertaneja
Q’eu agora vou dormir.



*PROFESSOR DE LITERATURA NO DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E TECNOLOGIAS – CAMPUS XXII DA UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB EM EUCLIDES DA CUNHA.













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