Canudos à Contraluz Na Cultura Literária

MINADOURO

MINADOURO  por José Plínio de Oliveira* 


                
– Pode pegar a bacia que você faz asseio íntimo, bote água e traga pra cá...
O Doutor Jonas Fidelis Moreira Falcão havia despertado às dez horas da manhã de um sono pesado por uma carraspana densa que o levou a sonhar com as estrelas. Dormiu na casa simples da jovem concubina, situada em um beco obscuro do Bairro do Minadouro em Feira de Santana. Ainda trajado em ceroulas, mas com o tronco nu, ia começar a barbear-se para depois pensar o dia. Então a moça tirou algumas peças íntimas postas de molho em uma pequena bacia esmaltada, enxaguo-a um pouco, pegou uma jarra cheia, uma toalha de rosto e levou tudo para o Doutor que já se mirava em um pedaço de espelho um tanto embaçado, fixado com argamassa na parede de adobo do exíguo quintal da casa. Ele iniciou o ritual matutino e com pouco expressou:
               – Caramba!
               – O que foi home?
               – Hoje é o dia do julgamento do menino de comadre Margarida!
               – Eu já ia te lembrar...
               – Mas é à noite, eu posso me espairecer um pouco...
               – Que horas vai ser?
               – Sete horas.
               – Pera aí que eu vou buscar a toalha para você enxugar o rosto.
               – Esta aqui tá boa. (Lançando mão da mesma toalha que haviam utilizado na cama e que então se achava no varal).
               – Depois mande o menino de Albertina buscar um terno lá em casa. Vou precisar para o Júri.  
            
O Doutor Jonas Falcão, como era popularmente conhecido em Feira de Santana, Cacheira de São Félix e Salvador jamais concluiu uma formação acadêmica. Filho de abastada aristocracia pecuária da região, desde muito jovem passou a levar a vida de bordel em bordel, de cabaré em cabaré, de castelo em castelo, bebendo, jogando, fumando charutos caros e dormindo com as moças mais cobiçadas do mercado da prostituição. O pai ameaçou deserda-lo caso não se dedicasse aos estudos para obter um anel de doutor com que honrasse a família. Então ele ingressou na Escola de Medicina e Cirurgia da Bahia, mas, algum tempo depois durante um jantar na casa paterna manifestou o desejo de abandonar o curso: alegando ter problemas em lidar com sangue; além disso; tinha que manusear instrumentos de necropsia cheios de dentes para dissecar corpos e estudar órgãos e tecidos.
               – Ah! Tens medo de sangue e de dentes... Por isso não podes estudar medicina!...
               O velho Sebastião Falcão era tido como um homem austero, conservador e honesto, mas de coração generoso e compassivo. Proprietário de fazendas de gado do Rio Paraguaçu ao Rio São Francisco, vivia sempre na labuta com os labores da pecuária e os cuidados com a família. Todo trajado de roupa de couro entre os vaqueiros na azáfama do gado, não fazia diferença nenhuma. Era um trabalhador tão comum quanto os demais. Punha a mão no pesado como todos os vaqueiros. Mas tinha um sonho: por isso insistia muito na formação do filho.
               – Menino, o que é que tu queres da vida nestes tempos de tanta luta? Pretendes somente viver de sombra e água fresca?
               – Oxente! Tião... já vai implicar com o menino? – Dona Santinha veio logo em defesa do filho, tomou-o pelo braço e o retirou da sala-de-jantar.
               Quando a Senhora Dona Santinha Falcão evocou a interjeição “Oxente!” Naquele contexto tão cerimonioso para uma família católica da cidade de Feira de Santana – o espaço das refeições –, também enunciou de forma vibrante o acento linguístico típico daquela imensa região do sertão baiano; denotando a marca identitária peculiar de uma oralidade rica em símbolos e signos que se iam esparramando por um território linguístico ainda muito conservador, muito colonizado, muito formal e muito normativo. Portanto, o vocábulo “Oxente!” que vem da matriz “Oh! Gente!” de origem portuguesa, pronunciado à hora sagrada e recatada do repasto vespertino da família feirense do século XIX, não pode ser pensado como mera corruptela. Não! Esse corpus é uma forma de expressão visceral da linguagem orgânica de um povo miscigenado e historicamente mergulhado nas profundezas da colonização canônica. Logo, afastadas todas as insinuações de preconceito linguístico, “Oxente” tem um caráter interjetivo tão incisivo que, além de afirmar a vitória da informalidade libertadora sobre os preceitos canônicos “da ordem do bem dizer”, fundamentada em significados, também revela uma vontade imbatível de flechar o coração do colonialismo linguístico para alcançar mais adiante uma língua viva em uma sociedade sedenta de Liberdade. Inclusive Liberdade de Expressão Plena. Portanto, a pronúncia de um “Oxente” naquele clima de feirensidade impávida abriu um amplo devir para as influências das Línguas Africanas que inundaram o Recôncavo Baiano e foram erodindo a língua do dominador e diluviando de africanismos as regiões sertanejas da Bahia. Também levando ao encontro das Línguas e Culturas Indígenas. Dessa forma, as próprias linguagens culinárias servidas nas mesas das aristocracias baianas, com as tônicas dos temperos da África que cativavam os paladares mais exigentes, e os toques da tropicalidade do índio que coloriam alguidares e aribés, terminavam por inferir disposições novas nas linguagens expressivas do cotidiano das sociedades sertanejas da Bahia.
               Mais adiante, na Bahia surgirá “Oxi!” como resultado da economia de trocas linguísticas que passa a comprimir a expressão “Oxente!” ou então “Oh Gente!” tal como a norma dita culta prescrevia. Ora, se a variação padrão é vencida ou transgredida pelos usos de um cotidiano que mistura primitivismo com canonismo; em que africanismo e indianismo entram em cena, ou melhor, em significantes. Logo quem ganha com tudo isso é o Patrimônio Linguístico de um povo. Por isto é muito estranho que a Bahia tenha submergido no anedotário brasileiro, principalmente nas regiões Sul e Sudeste, por questões de usos de linguagens. Causa espécie, porque a linguagem pode ser e é o espaço mais seguro de expressões de identidades e poeticidades de um povo. Por isso, perdeu-se a poeticidade destas identidades de linguagens da Bahia em consequência do preconceito linguístico construído à margem do conhecimento cultural.
               Também as liberdades de linguagens são por natureza criativas e inventivas, e tendem a estimular – em um caso mais específico – formas mais desabridas que marcam os falares feirenses, até então censurados naquele contexto do século XIX. Naquele momento, Dona Santinha fraturou a espinha dorsal já fossilizada do Latim dito Vulgar e ofereceu a outra face de uma língua feirense que tentava desenvolver-se nos espaços domésticos da Sociedade dos Fidalgos e Vaqueiros de Feira de Santana, a Roma Negra do sertão baiano. Logo, Seu Sebastião bispou a oportunidade de entrar na medula daquela linguagem transgressora e soltou o verbo:
               – Ah! Eu já sei: tu tens medo de sangue, mas não tens medo de boceta porque boceta não tem dente. Não morde a tua pica, mas morde o meu bolso. Tu pensas que para manteres uma puta numa pensão de alcoviteira da Rua de Aurora sai barato para mim, seu descarado?
               Seu Sebastião continuava a falar para os vaqueiros, boiadeiros, demais trabalhadores e familiares presentes à mesa:
               – Sujeito vagabundo! Só quer viver nas putarias... Qualquer dia desses vai estar encangado com as rameiras do Minadouro. É aí que tem que estudar medicina mesmo para curar as doenças-do-mundo que vai arrumar... Sujeito descarado... Toma cuidado para não meter-te na aguardente! Lembra-te de que cu de bêbado não tem dono!...
               – Painho!!!
               – Minha filha, por falta de um grito, o cavalo cai no atoleiro.
               Contudo, Seu Sebastião não guardava miçangas de raiva no coração. Podia ralhar com um erro parte da noite, mas ao amanhecer do dia já não se lembrava de nada. O seu coração sabia ser compassivo.
               Na manhã do dia seguinte o jovem não apareceu para o café. Todavia, Dona Santinha foi apaziguando as coisas. Trata daqui, ajeita d’acolá. O certo é que à noite havia convencido o esposo a mandar o menino para a França, com vistas à Universidade de Sorbonne.
               – Ele tem vocação é para bacharel. Direito, homem!
               – Então que vá e seja muito bem sucedido. Você está aí, pode tomar as providências.
               De madrugada, o chefe de família sairia com os vaqueiros para tocar uma grande boiada de uma fazenda de sua propriedade em Bonfim de Feira para os negócios de Itapetinga. De lá iria com os auxiliares para compras de gado de engorda em Minas Gerais, visando ao aproveitamento de pastagens em suas propriedades das Lavras Diamantinas. Com isso, ficaria viajando por cerca de dois meses; o que deu tempo de sobra para o filho Jonas chegar a Paris.
               Na capital francesa, o moço encontrou os caminhos do Quartier Latin muito antes de achar a entrada da universidade. Quando passou a alisar os bancos da academia já estava escolado nos saberes desregrados da noite parisiense. Todavia, depois de alguns estudos na Sorbonne e muitas noitadas nos antros das libertinagens francesas, passou a relatar nas correspondências regulares à família a nostalgia aflitiva do Brasil que vinha se abatendo sobre ele. Até que passou a insinuar a sua transferência para a Escola de Direito de Pernambuco. A esse respeito, havia procurado o cônsul do Brasil em Paris. Preparou bem o terreno, logo depois comunicou a vinda para Recife; tudo em razão do interesse pelos estudos. Comoveu os familiares. Algum tempo depois da estada em Pernambuco transferiu-se para a Escola de Direito em São Paulo. Tudo visando ao seu melhor aprimoramento nas ciências da jurisprudência; escrevia ele a Dona Santinha. Passou o tempo...
               No tempo da Festa de Senhora Santana, estando na casa paterna de férias da faculdade, veio a conhecer a Senhorita Ana Clara Pacheco D’Oliviera, filha de uma importante família de pecuaristas herdeiros de grande parte do espólio sesmeiro de Guedes de Brito. A moça havia retornado de um internato na Áustria, sob a responsabilidade de religiosas católicas. Jonas Falcão apaixonou-se perdidamente por ela e foi correspondido; agradou principalmente ao pai muito interessado em relações de negócios com o maior clã de pecuaristas do Norte do Brasil. Por isso, abria mão do desejo de ver o filho formado na academia e ostentando um anel de Doutor, visando a um interesse maior de negócios. Dali em diante passou a incentivar o namoro até que naturalmente aconteceu a celebração do noivado.
               Noivo da Senhorita Clarinha Pacheco, como era melhor conhecida pela sociedade, Jonas Falcão passou a adotar na cidade uma postura admirável de cavalheiro digno das mais subidas honras. Foi logo nomeado Conselheiro da Intendência, admitido como membro da Sociedade Secreta, da Irmandade do Coração de Jesus, da Sociedade dos Jurisconsultos de Feira de Santana e, em consequência, o Rábula mais requisitado da região. Para projetar ainda mais a sua imagem de homem público, tornou-se Sócio Benemérito da Euterpe Feirense. E estando a preparar-se para o enlace matrimonial, recebeu de presente do pai um palacete suntuoso na Senhor dos Passos. Pouco tempo depois, casou-se.
               Casado e pai de filhos e filhas, e já com a cabeleira agrisalhada, o poder dominante descobriu o carisma popular de Jonas Falcão, que apesar de muito rico, foi sendo cooptado para a atividade política por força dos interesses do Poder, tornando-se cativo dos interesses soberanos da política e da sociedade. No fim de uma tarde chegou a casa para uma trégua reconfortante, depois de uma reunião exaustiva na Mesa de Rendas, de que era diretor; com vistas ao financiamento do próximo pleito eleitoral. Tendo à noite daquele mesmo dia um compromisso demorado na Sociedade Secreta com os mesmos objetivos. Depois do banho habitual, enquanto trocava de roupa abriu o coração com a esposa: já não suportava mais os ônus de tantos compromissos. A sociedade sugava o indivíduo, impondo-lhe exigências exaustivas.
                – É duro suportar...
                – Jonas, faz parte.
                – Menina, eu sei... Mas é uma parte muito pesada. A sociedade suga o sangue da gente para manter uma fachada até discutível. São muitos códigos, muitas etiquetas, muitos fingimentos, muitos interesses, muitas hipocrisias, muitas leviandades, muitas falsidades, muitas vaidades, muitas injustiças. A sociedade forja o sujeito que ela quer, segundo os seus interesses; na maioria das vezes interesses escusos. Ela subtrai o caráter do sujeito e forja um outro, e joga com ele conforme as suas mazelas. Muitas vezes o sujeito se sente como uma bola de bilhar, jogada de um lado para o outro.
                – A vida é assim.
                – Talvez não deva ser assim... Você sabe? Essas eleições vão pegar fogo e sou eu que coordeno toda essa máquina trepidante. Aqui não tem ninguém que saiba fazer isto: interagir com os poderes da capital, esclarecer, negociar, barganhar, prometer, garantir e atender a interesses pessoais. É muita labuta! Às vezes chego em casa com os pés doloridos como se houvesse espinhos de mandacaru dentro dos sapatos. Sinto a gravata apertando-me o pescoço como se fosse me enforcar. Muitas vezes sinto-me a guisa da Bastilha. Aí eu tenho vontade de pegar o cavalo, descer para o Rio Jacuípe, tirar esta zorra toda e cair na água como eu fazia no meu tempo de menino com os moleques da Fazenda. Chegava a casa pela porta dos fundos, enlameado dos pés à cabeça, mas a velha Mãe Firmina me pilhava: “– Vai pro banho já, moleque traquino! Parece um leitão de chiqueiro!” Minha outra Mãe gritava lá de dentro: “– Comadre Firmina, onde este menino foi se meter?” “– Quem é que sabe Iaiá?” Então minha Mãe falava: “– Comadre Firmina, esse menino pode pegar uma sezão nas águas desse rio!” “– Iaiá, é mais fácil a sezão pegar dele!” Aí a Preta Velha que me criou ralhava comigo com autoridade de Mãe: “– Vai pro banho, vai já moleque descarado!” Pois é... Eu que escapei de sezões, sem escapar do ralhar de Mãe Firmina, agora corro o risco de não escapar da contaminação política.
                – Que é muito mais perigosa! Por isso é que eu penso que nestes tempos difíceis devemos nos aproximar mais da Religião.
                – Menina, você sabe... Os próprios clérigos membros da Maçonaria não são diferentes não. Eles são tão mesquinhos quanto... Pensam somente nos seus interesses estritos; olham somente para o centro do próprio umbigo. A única diferença é que usam a Religião como pano de fundo para dissimular as suas práticas levianas. Você sabe de uma coisa? Aqui nesta Feira de Santana quem sustenta a Religião são vocês mulheres. A devoção a Senhora Santana, a dedicação de vocês mulheres aos valores da Fé. Aí sim! É o que sustenta a Igreja. Pena que vocês, mulheres católicas, não tenham espaço mais decisivo dentro da Religião. Já a Religião Africana, o Candomblé, o cerne do poder está nas mãos das mulheres.
                Findas as eleições, Jonas Falcão passou a ter um pouco mais de trégua, e uma noite apareceu no cabaré de Maria Mulata.
                – Ora, vejam quem tá aqui!!! O Bom Filho à casa torna...
                – Um filho um tanto pródigo, mas retornando à noite Feirense!
                A cafetina o recebeu de braços abertos, tiveram um caso na juventude, mas depois as relações tornaram-se comerciais. Foram se dirigindo para o reservado, a fim de colocarem os assuntos em dia.
                – Ganhou nas eleições, ficou importante...
                – Menina!!!
                – Madrinha Margarida tá doida pra te ver.
                – Eu vou na casa dela.
                Dias depois foi Jonas Falcão à casa da velha doceira e Mãe-de-Santo muito querida em Feira de Santana. Lá, sem querer, avistou a jovem mulata Carminha.
                – Comadre, quem é esse sapotizinho?
                – Veio de Coração de Maria, mode morá mais nóis.
                – Já tem compromisso?
                – Não, ela chegou tresnontonte.
                – Comadre Margarida, eu tenho preferência...
                – Pode deixá, que eu ajeito pra voismicê! Mais eu quero lhe trazê um assunto... 
                Dona Margarida socializou a inteireza do assunto:
                Tomou um menino pretinho para criar há alguns anos. Chamava-se Agostinho. Uma pessoa de muito bom coração; uma pomba sem fé; foi se desenvolvendo e ficando com ela, ajudando-a em tudo. Era a sua mão direita: auxiliando-a nos trabalhos do Terreiro, cuidando dos assentamentos dos Orixás, ajudando no comércio dos doces, levando a mesa de doces para a feira e tomando conta de tudo. Um rapaz muito quieto e sossegado que não bebia, não fumava, não procurava mulher, não brigava com ninguém nem respondia mal. Entretanto, de uns cinco anos em diante, um sujeito passou a humilhá-lo com frequência, passando a chamá-lo de “Beiço de Jegue”. Eram constantes aqueles insultos, era só o rapaz chegar na feira para trabalhar que o sujeito passava a insultá-lo e as pessoas passavam a rir e a repetir: “Beiço de Jegue!” Dona Margarida ia contornando a situação: “Entregue a Deus, não se avexe, se tu se avexá é pió”. Mas um dia Agostinho perdeu a paciência e deu dezoito facadas no sujeito que morreu no meio da feira. Foi logo preso e ia ser levado a júri popular nos próximos dias. A sua condenação era dada como certa porque a vítima mantinha um relacionamento homoafetivo com um chefe político e autoridade importante em Feira de Santana. O temor de Dona Margarida era que o “minino” fosse parar no Engenho da Conceição.
                – Comadre Margarida, a senhora sabe como a Justiça da Bahia é leviana, parcial, promíscua, sórdida e subserviente em questões dessa natureza, principalmente porque o sujeito que foi morto era a grande paixão de um figurão poderoso desta terra. Mas a senhora fique sossegada que nós vamos ver o que fazer.
                – Eu confio em Deus, nos meus Orixás e no Sinhô!
                Encontramos o Doutor Jonas Falcão, abarrotado de Felicidade com a sua mulata Carminha naquela manhã singular do Bairro do Minadouro. Dia do Júri de Agostinho. Destarte, logo depois de barbear-se e trajar-se adequadamente compareceu ao Fórum, pediu o processo para ver, mas não conseguiu entender nada. A cabeça ainda se achava turbilhonada pelos conhaques e vinhos do dia anterior.
                Na hora do Júri, cumpridas as liturgias e formalidades de praxe, o magistrado pronunciou em tom muito cortês, moderado e magistral:
                – Com a palavra o Excelentíssimo Senhor Doutor Advogado de Defesa!
                – Excelentíssimo e Meritíssimo Senhor Doutor Juiz de Direito, Excelentíssimo Senhor Doutor Representante do Ministério Público, Excelentíssimo Senhor Doutor Representante da Acusação, Minhas Senhoras, Meus Senhores... (silenciou).
                O Juiz olhou de soslaio e reiterou:
                – Com a palavra o Excelentíssimo Senhor Doutor Advogado de Defesa!!
                – Excelentíssimo e Meritíssimo Senhor Doutor Juiz de Direito, Excelentíssimo Senhor Doutor Representante do Ministério Público, Excelentíssimo Senhor Doutor Representante da Acusação, Minhas Senhoras, Meus Senhores... (retornou ao silêncio).
                Irritadíssimo, rubro como azeite de dendê, aos berros, dando socos sobre a mesa, fazendo cair aos pés dos jurados o Vade Mecum, o Juiz ia conceder a palavra pela terceira vez quando lembrou-se de sacar o revólver que trazia sob a toga e foi contido a tempo pelo escrivão Almiro. Então o Doutor Falcão de fato e de direito tomou a palavra:
                – Senhoras e Senhores desta Egrégia Corte Justiça, se o simples fato de que tendo eu silenciado somente por duas vezes ia levando o Meritíssimo Doutor Juiz de Direito a atentar contra a minha vida, imagineis vós a situação de um pobre homem trabalhador que por mais de cinco anos foi humilhado, insultado, ofendido e execrado diariamente?
                Agostinho foi absolvido por unanimidade de votos e o Ministério Público abdicou de recorrer da decisão.    



                   
                                                   Serrinha, 14 de março de 2015.




*PROFESSOR DE LITERATURA NO DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E TECNOLOGIAS – CAMPUS XXII DA UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB. EM EUCLIDES DA CUNHA.

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