NÓS MATAMOS O CORONAVÍRUS
NÓS MATAMOS O CORONAVÍRUS
por José Plínio de
Oliveira*
Nestes tempos em que o
gigantismo das maiores potências econômicas mundiais dobram-se perante a
tragédia microscópica do novo coronavírus, daqui do Sertão de Canudos – de onde o mundo é
percebido nas suas nuances mais críticas – as pessoas tendem a entrar em pânico
com a ameaça virológica, apesar dos discursos persistentes e persuasivos
veiculados pelas mídias e proclamados pelos governos local, federal e, também,
pela Organização Mundial de Saúde propugnando por cuidados e controles efetivos.
Não obstante, a Região de Canudos não esquece de que foi trucidada por uma
epidemia política que gerou uma Guerra implacável exterminando milhares de
seres Humanos: idosos, mulheres e crianças, inclusive recém-nascidas,
principalmente entre os anos de 1894 e 1897. Portanto, a memória lúcida de
Canudos ainda desconfia das políticas e dos discursos do governo. As cicatrizes
deixadas pelo Holocausto do Sertão Baiano, ainda são muito perceptíveis em face
da Narrativa do Cotidiano do Sertão de
Canudos. Mesmo pessoas jovens sabem dos seus antepassados que foram degolados,
estripados, torturados e até queimados vivos por explosões de galões de querosene,
atirados dentro do arraial conselheirista já em chamas, e levados a extrema
combustão por disparos de canhões neles deflagrados. Nesta perspectiva de
leitura, as Forças Militares em operações contra Canudos foram o velho coronavírus daquela era que ainda deixa a história infectada. Talvez
por isso, a Memória mais consciente de Canudos ainda desconfie dos discursos do
Estado dito de Direito, mesmo em tempos de pandemia.
Como é possível que um vírus
aparentemente tão medíocre e de fato tão minúsculo, que se oculta por trás da
insignificância da invisibilidade covarde, para exterminar tantas vidas
Humanas; desafiando a Ciência e a precisão milimétrica das altas tecnologias de
ponta que somente podem estudá-lo através de instrumentos possantes sem ainda
chegar a um antídoto eficaz que nos traga esperança, possa tanto apavorar o
mundo? Nestes dias, nunca ficou tão óbvio para a Humanidade que a Ciência
contemporânea tem objeto próprio, método próprio, mas não é prescritiva.
Não estamos ainda distantes dos
terrores alarmantes causados pelas escaladas armamentistas nucleares e ameaças
de guerras atômicas, decorrentes das rusgas de governantes trogloditas e
reacionários; vociferando tragédias e deixando transpirar em seus pronunciamentos
públicos sintomas nítidos de distúrbios bipolares e esquizofrenias agudas incuráveis.
Assim, nestes tempos de tantas e tamanhas turbulências esquizofrênicas, quando
das aparições nas mídias para lançarem ao mundo ameaças e blasfêmias,
governantes poderosos não nos inspiram a pensa-los Chefes de Estados saídos de
palácios, mas loucos perigosos egressos de hospícios deploráveis em que a
Ciência não consegue prescrever o remédio adequado, deixando-os acometidos de
surtos incontroláveis a virem para diante de câmeras e microfones propugnarem
pela hecatombe total do Planeta Terra.
Em face da realidade do COVID-19,
de que valem os arsenais bélicos das grandes potências do mundo, ainda que sob
a égide dos discursos de Defesas Nacionais?
Pensar a mais-valia de aeronaves não
tripuladas, verdadeiras fortalezas aéreas capazes de destruições esmagadoras;
drones, satélites, bases militares, mísseis, antimísseis, bombas atômicas,
porta-aviões capazes de reduzir Nova Iorque a minúsculas partículas de átomos.
Em face da atual realidade, tudo isso é ineficiente perante o novo coronavírus!
Ou não é? A propósito, assim como tantas megalópoles capitalistas, Nova Iorque
uma espécie de Capital do Planeta Terra preparou-se ao longo de décadas, para
enfrentar organizações terroristas assassinas, com um aparato de segurança e um
sistema eficiente de informações infalíveis, mas agora, infelizmente, no âmago
dos Estados Unidos da América, a grande cidade prostra-se diante de um inimigo
que perpetra extermínios em massa; contra o qual a opulência armamentista do
Imperialismo Capitalista nada pode fazer. Nova Iorque que sobreviveu à
catástrofe do Word Trade Center cai agora
como a Babilônia do Terceiro Milênio perante o coronavírus, uma espécie de terrorista invisível que se multiplica intempestivamente
como átomos nucleares. Por tudo isso, ainda convém pensar a Escalada Espacial,
com foguetes, astronautas, plataformas, bases, laboratórios, cientistas pesquisando
micro organismos vitais em Marte, por exemplo, tendo agora vírus letais
destruindo o mundo diante dos seus narizes ou focinhos, como se diz no Sertão de Canudos.
E por falar do Sertão de Canudos – até por inspiração para pensar e escrever –,
também rememorando a sua garra e a sua Guerra histórica, pode-se ler ainda alguns
especialistas em geopolítica e relações internacionais que chegaram a cogitar
para os dias atuais a 3ª Guerra Mundial com A Coréia do Norte, debilitada por
uma economia nefasta para um povo pobre, ameaçando os Estados Unidos da América
– e vice-versa – com os seus mísseis intercontinentais, promovendo desfiles de
arsenais bélicos assustadores em majestosas paradas militares, típicas da
antiga União Soviética, entre aplausos ridículos e sorrisos forçados de uma
população oprimida e alienada à epopeia do desvario. O Irã enriquecendo urânio
e ameaçando os Estados Unidos por ter assassinado um dos seus mais importantes
generais, grupos terroristas pós-modernos aniquilando nações arquimilenares do
Oriente Médio, Israel arbitrando retaliações draconianas contra o povo
Palestino, a Itália impondo restrições macabras na Lampedusa às entradas na
Europa de refugiados de países em conflito, que para escaparem da morte
utilizam até embarcações infláveis, inclusive com crianças, senhoras gestantes
e idosos à bordo. E agora, a Itália que reprime com mão de ferro a refugiados pobres, mas apesar de tudo saudáveis, patrocina
cruzeiros marítimos milionários deixando ingressar em seu território o novo coronavírus assassino, exterminando
e ameaçando milhares de Vidas Humanas. Aqui muito próximo de nós, o ditador Nicolás
Maduro, uma espécie de Hitler Bolivariano, concentrando milhares de pessoas
pobres nas fronteiras com o Brasil e países vizinhos; pessoas humanas que
somente tentam escapar do extermínio pela fome. A propósito, há duas semanas
encontrei uma índia venezuelana esmolando com as suas crianças diante da Igreja
de Senhor dos Passos em Feira de Santana, como se o último homem clamasse por Misericórdia de dentro da sarjeta. Não
se trata aqui de uma reflexão emocional, mas de uma leitura racional. Um
racional que não exclui o Humano, mesmo nas ruas de Feira de Santana.
Feira de Santana tem uma longa
história execrável de populações de rua em estado de flagelo, e de populações
pobres de modo geral. Uma história de exploração implacável dessas pessoas,
inclusive para práticas de crimes. Uma cultura que remonta à era da escravidão.
Nos últimos tempos, chegaram a circular narrativas confiáveis aqui no interior
da Bahia de que pessoas indigentes são exploradas como “laranjas” para negócios
escusos de interesse da Aristocracia estabelecida e acima de qualquer suspeita;
inclusive aquisições de automóveis de luxo, imóveis suntuosos e etc. em nome de
pessoas que vivem esmolando nas ruas da cidade. Negócios realizados através de
fraudes e manipulações de documentos falsos. Dessa forma, a erradicação da
indigência e da miséria extrema não interessa aos exploradores delas. A
exploração do homem pelo homem no Nordeste do Brasil é epidêmica e a Aristocracia
Baiana é crudelíssima nas suas formas de opressões nefastas; somente podendo
ser comparada ao Nazismo de Hitler. Como será a Aristocracia da Bahia que
sobreviver ao coronavírus? Na
verdade, as atrocidades impostas pela Aristocracia Baiana são o velho coronavírus que há séculos aflige
o nosso povo pobre em todos os sentidos.
Quando voltei para a Bahia,
depois de ter vivido por mais de duas décadas na Região Sudeste do Brasil, sob
forte influência das Culturas Pensantes do eixo Sudeste/Sul, encontrei a minha
terra natal sob estiagem prolongada que acarretava grandes sacrifícios e grave
falta d’água, mormente para as populações do meio rural, do campo e das
periferias das cidades. Naquele período de estiagem ou seca, a temperatura ambiente ultrapassava aos 40 graus Celsius. Naquele
tempo, residindo na cidade de Feira de Santana tomamos conhecimento através das
mídias locais de que um fazendeiro mandou envenenar as águas de um açude de sua
propriedade – única reserva de água potável para uma grande comunidade –
visando a impedir que as pessoas se servissem do líquido precioso para suprir as suas necessidades. Antes desse
episódio, o então Bispo Diocesano de Juazeiro da Bahia Dom José Rodrigues de
Souza, de Saudosa Memória, excomungou um fazendeiro daquela região por impedir
a uma comunidade de ter acesso a água em um açude de sua propriedade, único
naquele contexto humano. Ocorre porém, que aqueles grandes proprietários rurais
contavam com a cumplicidade do Regime Militar e, portanto, tinham a seu dispor
o aparelho repressivo do Estado, o Poder Político e garantias de impunidades
asseguradas pelo Poder Judiciário. Neste contexto, é muito difícil articular um
movimento social de resistência aos crimes contra a Humanidade. As massas
oprimidas não conseguem se organizar em defesa de Políticas Públicas que lhes
assegurem Dignidade, Direito líquido e certo a segurança hídrica, segurança
alimentar, assistência à saúde, educação de qualidade e saneamento básico entre
outros, porque o governo põe um Trio
Elétrico nas ruas e logo as massas se desarticulam pondo-se a rebolar atrás
do Trio, aceitando passivamente e
rindo de todas as impudicícias e abjeções que lhes são impostas pelas
linguagens vociferadas pela máquina carnavalesca; sob a égide das Políticas Públicas Governamentais de Droga e
Circo. É dessa forma que as Potestades Políticas arrebanham votos de
cabresto para perpetuarem-se no poder. Esta realidade aqui na Bahia é de muito
difícil entendimento! Não obstante, Dom José Rodrigues não se deixou esmorecer.
Era a época da construção do Lago de Sobradinho e as populações ribeirinhas
estavam sendo expulsas de suas terras sem nenhuma garantia de (re)assentamento.
A Diocese de Juazeiro teve que trabalhar muito.
Missionário Redentorista, e
natural de Paraíba do Sul no Estado do Rio de Janeiro, terra natal do também
não menos Ilustre Doutor Heráclito da Fontoura Sobral Pinto, Dom José Rodrigues
vinha de uma Paraíba do Sul com uma Tradição em que a Dignidade da Pessoa
Humana e o Sentimento de HUMANIDADE estão acima de qualquer outro valor. Por
exemplo, ainda muito criança, a caminho da escola primária, o futuro Doutor
Sobral Pinto viu um carroceiro sendo espancado por um soldado de polícia,
correu logo em socorro da vítima, enfrentou o soldado e depois foi à delegacia
de polícia prestar queixa.
Adulto, já exercendo a advocacia
no Rio de Janeiro, foi o Doutor Sobral Pinto solicitado a defender o preso
político Luís Carlos Prestes ao tempo em que Olga, esposa do preso, em estado
de gestação era entregue pelo governo de Getúlio Vargas aos asseclas de Hitler,
para ser morta em uma câmara de gás nazista. Enquanto Prestes estava marcado para morrer em uma cela imunda,
infecta, úmida e fria de uma das Bastilhas
do governo brasileiro. Logo em visita ao preso, o Ilustre e Magnânimo
Jurisconsulto pensou que arguir aos Direitos Humanos no Brasil visando a obter
assistência digna prescrita pela Lei perante um Poder Judiciário como o que
temos, para um detento mantido encarcerado em condições desumanas, seria
considerado ingênuo, senão estúpido. Assim como no Sertão da Bahia será para
quem o fizer em defesa do homem flagelado pela marginalização e pela miséria
extrema. Todavia, naquele momento, o Doutor Sobral Pinto foi iluminado por um insight magnífico e requereu para o
paciente da Justiça os benefícios da Lei de proteção aos animais. Nós,
Brasileiros devíamos preservar uma VERGONHA de consternar o Mundo Civilizado!!!
Tempos depois, do momento de
Sobral Pinto, Dom José Rodrigues encontra em condições análogas às de Luís
Carlos Prestes, prisioneiro do Estado, trabalhadores rurais e do campo na
Diocese de Juazeiro, subsistindo em cárceres simbólicos às margens do Rio São
Francisco e à margem de todo e qualquer Direito Constitucional. A defesa
impávida desse Direito, submeteu o Apóstolo de Juazeiro ao crivo perseguidor do
Regime Militar e até risco de atentado, e assassinato por prática do regime
ditatorial. Assim, pensando agora o tempo de Dom José Rodrigues, como teria
sido o Regime Militar do Brasil instaurado em 1964, se o novo coronavírus tivesse ocorrido, infectando os quartéis, o
Palácio Duque de Caxias, o Palácio do Planalto, o Congresso Nacional, o STF, o
STJ, os fóruns, as comarcas, as bases do DOI-CODI, da OBAN, das polícias? Como
teriam sido as prisões, os sequestros, as torturas, os empalamentos, as
sevícias, os assassinatos, as extorsões, as chantagens, os assaltos e os roubos
perpetrados pelo Estado de Direito então acometido pelo COVID-19? Como os
militares brasileiros da Ditadura teriam tratado a família de refugiados
venezuelanos em Feira de Santana?
A prostração daquela família de
refugiados venezuelanos, esmolando naquele momento em Feira de Santana também
leva a refletir sobre a história recente e a pensar a cidade de Feira de
Santana enquanto herdeira de uma micropolítica hedionda e centro propulsor de
um capitalismo típico do Terceiro Mundo em sendo perverso, fraudulento,
corrupto, preconceituoso, concentrador, excludente, escravagista e explorador
ao extremo. Principalmente a exploração do corpo humano na degradação extrema
do flagelo.
Abramos um parêntesis para uma abordagem
que, embora indesejável é imprescindível: são comuns nas feiras livres e
logradouros das cidades daqui do Sertão da Bahia a circulação de automóveis em
estado deplorável, equipados com aparelhos sonoros sobre os seus tetos, transportando
nos bancos traseiros imundos e purulentos pessoas miseráveis, ditas enfermas e
assemelhando-se a cadáveres ambulantes; esmolando em elevado som eletrônico. Os
equipamentos sonoros veiculam mensagens com fundos musicais religiosos de uma
pieguice humilhante, secundados por apelos patéticos à caridade pública. Em
geral, os conteúdos das mensagens socializam que a pessoa doente transportada
foi vítima de assalto, acidente de trabalho ou acidente de moto e que precisa
submeter-se a intervenções cirúrgicas, mas “não tem como pagar, por isso está
pedindo ajuda”. Pede-se de tudo: dinheiro, alimentos não-perecíveis e etc.
Há momentos em que a mensagem
convida transeuntes a aproximarem-se do automóvel para assistirem ao “espetáculo
deprimente” do corpo deplorado pelo flagelo repugnante, tornando-o objeto
abjeto do apelo persuasivo da indigência macabra. É uma forma perceptível de
manipulação da microfísica do poder da
miséria, exposta em comoção púbica. Os corações mais sensíveis desabam
consternados, oferecendo donativos. E o sujeito que dirige o veículo e explora
o corpo moribundo vai recolhendo as ofertas com a ferocidade de um cão faminto.
Fazendo-o diante de patrulhas da polícia, igrejas e órgãos públicos, deixando
até pairar suspeitas de cumplicidades implícitas. Há uma verdadeira Indústria nesse sentido. Recentemente descobriu-se
que na verdade quadrilhas alugam a famílias paupérrimas indivíduos que já
nasceram portadores de enfermidades e deficiências, e como o Estado não presta
a devida assistência determinada pela Constituição Federal passam a ser
exploradas pela Indústria da Mendicância;
da mesma forma como o Estado aluga corpos sexuais para serem explorados pela Indústria Cultural nas demandas
carnavalescas da Bahia e oferecidos a turistas e tarados.
Acreditamos que tais realidades
somente ocorram no Nordeste Brasileiro; não se tem notícias de que em outra
região. Ainda nesta perspectiva de leitura, o corpo que apodrece no interior de
um veículo decrépito a esmolar na praça pública contracena com os corpos que se
deterioram moral, física e espiritualmente nas grandes e desregradas orgias carnavalescas,
micaretas, vaquejadas e demais festejos públicos patrocinados pelo Estado. Nestes
espaços, são proporcionados exageros de sensualidades e depravações sexuais sem
precedentes e que atingem picos surpreendentes, como o novo coronavírus agora. Moças, meninas, crianças e adolescentes,
semidespidas são projetadas para os extremos das promiscuidades sexuais desregradas
e sem nenhum limite. Porque nesta parte do Sertão da Bahia há algumas situações
em que o corpo é tão somente um objeto que deve satisfazer a prazeres que
preencham crateras psicológicas. Neste sentido, prevalece o convencimento
cultural fossilizado de que os fins
justificam os meios. Não importa o que os indivíduos façam com os seus
corpos para a suprir necessidades materiais e subjetivas prementes; contanto
que essas sejam supridas. Por exemplo: para atender a necessidades de
subsistência é tolerável que uma mãe pobre e desvalida alugue uma filha
criança, para satisfazer as taras de um pedófilo rico e poderoso, por exemplo
em um ambiente carnavalesco da Bahia. Prevalece aqui o dogma de que manda quem pode e obedece quem tem juízo.
Ainda carecemos de um estudo meticuloso sobre o Caráter Moral e Identitário da
Bahia.
Não tratamos de juízo de valor,
crítica mordaz, casuísmo, perfeccionismo, censura austera. NÃO! Mas devemos e
podemos tirar muitas lições desta era de COVD-19. Porque os corpos humanos que
o coronavírus vem dilacerando
assemelham-se aos fagocitados pelas demandas culturais deploráveis que
disseminam HIV, DSTs, estupros, violências, narcotráficos, dependências
químicas, alcoolismos e demais patologias. Aqui na Bahia, o coronavírus não é causa, é efeito.
Ainda nesta parte do Sertão do
Nordeste, o COVID-19 é antecedido por uma pandemia de injustiças, crises
espirituais, morais, sociais, humanas, políticas, econômicas e etc. Nós que
historicamente convivemos passivamente com os vírus das corrupções políticas, dos descalabros, dos desvios de
recursos públicos, dos votos de cabrestos, dos falsos médicos assassinando
doentes pobres em hospitais públicos, das explorações dos bolsões de miséria
extrema e desumana, nos próximos dias mataremos o coronavírus. Aqui ele poderá até – infelizmente – matar muita
gente, mas, nos próximos dias mataremos o coronavírus
de vergonha, principalmente quando ele circular pelos espaços macabros e abjetos
de hospitais públicos, postos de saúde, escolas, instituições políticas, órgãos
do Ministério Público, da Polícia e da Justiça. No caso de o COVID-19 circular
por órgãos da Justiça Baiana cometerá suicídio quando tiver conhecimento de que
alguns desembargadores do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia encontram-se
presos e afastados das funções por um ano, responsabilizados por ônus de provas
convincentes de crimes abomináveis. Não é possível que um vírus perigosíssimo, por mais letal que seja, resista às desgraças
e depravações vergonhosas que nos são impostas neste Sertão do Estado da Bahia,
dissimuladas por uma cultura de cinismo endêmico que propaga para o mundo
discursos absurdos de falsa alegria.
Que o mundo civilizado saiba que
os bônus de cinismo e falsa alegria que a Bahia arbitra aos miseráveis
flagelados, e os transforma em imagens e linguagens carnavalescas para
ludibriar o mundo civilizado são uma farsa. Nas suas formas de explorações e opressões
para com os pobres, a Bahia é injusta, escravagista, preconceituosa, perversa, reacionária,
cruel, covarde, repressiva e truculenta. Na Bahia persiste uma cultura absurda
de Poder e Prepotência, acobertada pela cinismo e pela leviandade.
Pense
um absurdo! Proclamava um antigo govenador da Bahia. E completava, na Bahia acontece! O coronavírus é um desses muitos absurdos numa escala mais global gerando guerras, concentrações de
riquezas e poder em mãos de poucos, especulações financeiras, trustes,
recessões, desempregos, epidemias, exílios diaspóricos e elasticidade da
pobreza provocada por infecções opressivas que contaminam as micropolíticas. Diante
disso, a realidade contemporânea nos leva a arguir a História, também no
sentido de pensar se é seu propósito fabricar o Último Homem, segundo a obra de Francis Fukuyama. Óbvio que
Fukuyama não pretende insinuar a morte da História; sabemos que a História
mesma incólume é imortal até pela sua natureza; mas se ela for contaminada pelo
capitalismo consumista, pode subsistir em sua incolumidade?
Nossos mais profundos
pensadores chegaram à conclusão de que não existe isso que chamamos de História
– ou seja, uma ordem significativa no amplo movimento dos eventos humanos. Aparentemente
a experiência nos ensinou que é mais provável que o futuro contenha males novos
e não imaginados, desde ditaduras fanáticas e genocídios sangrentos até a
banalização da vida através do moderno consumismo, e que desastres sem
precedentes nos aguardam, desde o inverno nuclear até o aquecimento total do
globo. (Fukuyama, 1992,
p. 30).
Salvo melhor juízo, se a História
chegou a ser pensada como lógica linear de ordem
significativa, carece de ser arguida em termos de sequência lógica do movimento dos eventos humanos. Estes,
aparentam-se tumultuados como oceanos revoltos, impulsionados por revoluções de
ditaduras fanáticas, genocídios
sangrentos e, como se não bastassem, a pandemia do moderno consumismo. Neste sentido, o pensamento de Francis Fukuyama
afigura-se profético. Tratar de um futuro
que contenha males novos. O novo coronavírus é um desses males que
vem superando as expectativas dos desastres
sem precedentes (que) nos aguardam,
desde o inverno nuclear até o aquecimento
total do globo. E nas atuais
circunstâncias, O fim da história poderá
vir a aludir a um homem inútil e desprezível, mas sem inverno nuclear, sem aquecimento
total do globo, embora o coronavírus
assemelhe-se aos efeitos hediondos de ataques nucleares em escala mundial que
vão-se irradiando.
“Vou falar-lhes então do que há de mais
desprezível: quero dizer, o último homem”. Friedrich Nietzsche.
Quando o último homem prepotente, mentor e vítima do capitalismo pandêmico
que infecta as economias dos países pobres se torna desprezível segundo o pensamento de Nietzsche, as grandes potências
do mundo passam a sofrer as consequências.
REFERÊNCIAS
AGUIAR,
Durval Vieira de . Descrições práticas da
província da Bahia . 2. ed. Rio de Janeiro: Cátedra, 1979.
CUNHA,
Euclides da . Os sertões . São Paulo:
Nova Cultural, 2003.
FOUCAULT,
Michel . Microfísica do poder . Rio
de Janeiro: Graal, 1979.
FUKUYAMA,
Francis . O fim da história e o último
homem . Rio de Janeiro: Rocco, 1992.
GALVÃO,
Walnice Nogueira . Desconversa . Rio
de Janeiro: UFRJ, 1998.
MAQUIAVEL,
Niccoló . O príncipe . 6. ed. São Paulo:
Hemus, 1977.
MORAIS,
Fernando . Olga . São Paulo:
Alfa-Ômega, 1987.
NIETZSCHE,
Friedrich . O prólogo de Zarathustra. In:
Biblioteca Internacional de Obras Célebres. v. XIX. Rio de Janeiro: Sociedade
Internacional, S/D.
SPÍNOLA,
António de . Portugal e o futuro . 5.
ed. Lisboa: Arcádia, 1974.
Serrinha, 12/04/2020
*PROFESSOR
DE LITERATURA BRASILEIRA NO DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E TECNOLOGIAS – CAMPUS
XXII DA UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB. EM EUCLIDES DA CUNHA.
Leave a Comment