FREUD DILACERADO
FREUD
DILACERADO Por José Plínio de Oliveira*
O DOUTOR SÓFOCLES AUGUSTUS
PETRINI MANFREDI concluiu suas pesquisas na USP e foi trabalhar com a sua
colega Nise da Silveira no Museu de
Imagens do Inconsciente. Mas foi aí que ele passou a defender a teoria de
que: O sexo não está no centro da
realidade humana. O que nele há é uma tensão permanente entre o desejo e o
efeito disruptor implicado no cotidiano dos sujeitos. Partindo dessa
convicção científica, depois incorreu em leituras de Guattari, Suely Rolnik, Foucault,
Deleuze e Roland Barthes. Mais adiante, foi trabalhar em Bruxelas, Tel-Aviv,
Viena, Roma, Amsterdã e Nova Iorque. Voltou para o Brasil três dias antes do
atentado contra o Word Trade Center.

Psicanalista de renome, volta agora o
Dr. Manfredi a clinicar na cidade de São Paulo e a trabalhar como consultor
para universidades estrangeiras e institutos de psicologia aplicada e de
psicanálise. Assim, em consultório de hospital suntuoso no elegante bairro dos
Jardins também passa a maior parte do seu tempo; ao ritmo em que escreve a sua
obra-prima: A Sociedade Pós-Moderna e os Problemas
da Sexualidade Humana. E sempre que recebe colegas e pesquisadores do
exterior, mesmo antes de apresentar a equipe de trabalho, apresenta-lhes o aparelho
telefônico:
– Este é o nosso Freud. Ele é quem mais
escuta aqui...
Homem de escrúpulos e de minúcias
exaustivas, está agora no consultório tendo uma jovem paciente ao divã:
– Narre com mais detalhes essa
experiência que a senhora teve com o rapaz!
– Ah! Sim, doutor... Primeiro ele
começou a beijar-me os lábios, e o pescoço; depois foi descendo para os seios. E
então eu comecei a ficar excitada. Percebi que ele tirava a minha blusa e já me
beijava toda. Eu sentia a sua língua como uma coisa felpuda, esponjosa, quente
e úmida que deslizava das pontas dos meus seios até a região do umbigo. Doutor,
eu sentia arrepios indescritíveis e um prazer louco me tomava toda. Foi aí que
me dei conta de que as minhas próprias mãos punham-se a empurrar a cabeça dele
para baixo...
– Como assim? Como assim? Narre
com mais detalhes. Eu quero detalhes minuciosos!... E o que a senhora sentia
nesse momento? Por favor, descreva-me com mais detalhes. Eu quero minúcias. Até
agora, parece-me que ele só havia retirado a parte de cima da vossa roupa; se é
assim a senhora ainda estava em parte vestida...
– Sim! Eu ainda estava de saia e
calcinha, mas desesperada para retirá-las. Cada vez que a língua dele deslizava
sobre mim. Ai! Doutor Manfredi, eu sentia desejos de entregar-me toda...
– E não o fazia por quê?
–
Presumo que algum resquício de escrúpulo feminino.
–
Sim. É possível... Por favor, continue e seja minuciosa ao máximo.
– Eu percebia que estava toda molhadinha e ele foi despindo-me da saia
de forma delicadíssima. Ai!... E quando
inteiramente nua; ele passou a beijar sofregamente o meu sexo e
foi aí que eu cheguei à loucura...
– Nesse momento, a língua dele já ia
penetrando na sua vagina?
– Não, ele me ia beijando as coxas,
chupando, mordendo e eu empurrava com a mão
a cabeça dele para dentro de mim;
quando senti que a ponta de algo quente, molhado e muito
agitado
deslizava sorrateiramente para o meu clitóris...
Trinnnnnnnnnnnnnnnnnn.
–
Com licença, por favor.
Doutor
Manfredi foi à recepção, tirou a peça do gancho como se a estrangulá-la. Tomou o telefone e saiu pelos corredores
do hospital com o aparelho em uma mão, arrastando os pedaços
de fios e o fone apertado na outra, como que silenciado à forca aquele
instrumento de comunicação. Os seus cabelos revoltos e desalinhados, o seu
andar resoluto, o seu olhar esfuziante, davam-lhe a aparência trágica de um
autômato desorientado. Passou por ampla sala de espera repleta de gente; os
fios do telefone embaraçaram-se em uma árvore
de natal. E lá se foi ele, seguido por uma via láctea de estilhaços de lâmpadas coloridas e de fitas
reluzentes como metais preciosos. E quando chegou diante da parede de vidro da
central telefônica projetou contra ela os objetos que trazia
às mãos:
– Eu já avisei nesta porra! Neste
caralho! Quando estiver com paciente ao consultório
jamais poderei ser interrompido.
Serrinha, 04 de setembro de 2005.
*PROFESSOR DE LITERATURA NO
DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E TERCNOLOGIAS – CAMPUS XXII DA UNIVERSIDADE
DO ESTADO DA BAHIA – UNEB EM EUCLIDES DACUNHA.
Leave a Comment